26 dezembro 2006

Memórias de Minhas Putas Tristes - Gabriel García Márquez

É freqüentemente dito que há algumas coisas que um artista não deve fazer, e que uma delas é confessar a própria ignorância, ao menos em sua área de atuação. É, claro, uma atitude covarde e que menosprezo. E é então por esta razão que assumo abertamente: Não li Cem Anos de Solidão, do Gabriel García Márquez.

Não li e pronto. Juro que tentei, mas não estava numa fase propícia para a leitura. Sei lá, o livro simplesmente não me ganhou e eu nunca mais retornei a ele. Ficou na lista dos reservas em caso de estiagem literária, que até hoje não aconteceu. Já tive safras ótimas e péssimas, mas nunca magras o suficiente para que eu retornasse ao velho ganhador do Nobel.

Claro, já deixei de ler diversos dos clássicos intitulados "indispensáveis", mas isto não vem ao caso. Uma confissão por vez. Só confessei este em particular pois acabei de ler Memórias de Minhas Putas Tristes, do mesmo Gabriel García Márquez, que ganhei de amigo secreto e devorei. Os mais puristas já devem estar arrepiados. "Finalmente!", exultarão. "Agora ele ficou maduro!". Pode ser, pode ser. Vamos com calma. O fato é que este livro, diferente do outro, fala a minha língua. Márquez foge dos regionalismos e opta por uma narrativa intimista e carregada de melancolia (muito semelhante, sem falsa modéstia, ao estilo que uso no blogue do Psicopata Enrustido). Logo nos primeiros capítulos somos arremessados a uma situação tão insólita que se torna verossímil pela frugalidade com que é narrada. Às vésperas de completar 90 anos o protagonista (seu nome não é revelado) decide contratar uma prostituta virgem. Antes que assimilemos a idéia (que pode ser considerada até mesmo repugnante) ele já telefonou para a cafetina e acertou tudo. A partir daí o ritmo desacelera e justifica o título. Vemos um velho escritor narrando passagens marcantes de uma vida medíocre, sem as esperanças e aspirações da juventude. E é neste contraponto que a obra finalmente fisga o leitor.

O protagonista, na melhor tradição bukowskiana ou mesmo beatnik, é uma criatura desprezível. Tão desprezível que ele mesmo se menospreza diversas vezes durante a narrativa, tornando até mesmo a própria visão no espelho uma imagem desagradável. É neste aspecto que Márquez cria a empatia com o leitor. O fato do velho ter consciência de que é uma criatura repreensível e moralmente falha faz com que, se não simpatia, geremos ao menos compreensão por seus atos (especialmente quando ele diz que nunca teve uma mulher que não precisasse pagar pela companhia, e mesmo as que não cobravam ele fazia questão de pagá-las, como alguém pouco disposto a aceitar indulgências).

A partir deste momento deixamos de nos importar com a possibilidade de testemunharmos o estupro de uma menina de 14 anos, virgem e empobrecida, nas mãos de um pedófilo quase centenário. O ato grotesco que poderia acontecer ao invés disso se torna um lamento, uma agonia, pois a paixão que surge do velho pela garota (sempre adormecida) é quase inocente, platônica, idealizada. E a tristeza com que ele percebe que aquela era a primeira vez em sua vida que ele se apaixonara, e que não tinha muito tempo de vida para usufruir daquela paixão é de uma tristeza contagiante, pois percebemos junto com o protagonista que sua vida foi desperdiçada em um vazio sem amor.

O final é tão melancólico quanto todo o livro, deixando pontas soltas e perguntas sem respostas, como uma vida que de repente se finda sem que todas as pendências sejam resolvidas. O sentimento ao terminar a leitura é de um anti-clímax, de cumplicidade com uma perversão que não se consuma mas nos consome. E o que fica não é culpa, mas angústia.

Vamos ver se agora, após esta curta mas extremamente prazerosa leitura eu consiga finalmente preencher a lacuna em minha bibliografia e ler de uma vez por todas o livro que fez de Gabriel García Márquez o monstro literário de hoje. Acho que estou maduro o suficiente para tanto.

(Sei que ando meio sumido, mas foi por razões proletárias além de meu controle. Espero retomar o ritmo agora. Aliás, tem pôste novo no Psicopata Enrustido. Já leu?)

14 dezembro 2006

Sou mais Inimigo Declarado que Amigo Secreto

Poisé, poisé, começou a Temporada Anual de Caça aos Amigos Secretos. Sim, sim, a famigerada brincadeira de origem pouco definida (de acordo com um usuário do Yahoo! Answers é um ritual nórdico, mas não há uma fonte citada, então desconfiem sempre de explicações que envolvem a palavra-coringa "ritual"), mas que na verdade é usada por uma simples razão: reunir uma cambada de pessoas que mal se conhece mas que convive diariamente junto numa confraternização onde você só precisa comprar um único presente. É, Amigo Secreto (ou, cariocamente, Oculto) é, lá no fundo, uma festa de pobre. Conviva com isso.

É um mico. Primeiro o sorteio. Sempre que eu abro o famigerado papelzinho temo três coisas: tirar um desafeto (afinal, é trabalho!), tirar um desconhecido (clássico) ou, o pior de tudo, tirar seu chefe.

No caso do desafeto é complicado. Primeiro comprar uma coisa para alguém que você não gosta. Depois, na hora da entrega dos presentes tirar uma foto junto do cara, com um sorriso laranja-fim-de-feira estampado na fuça. Usando o chavão moderninho, ninguém merece!

Já no caso do desconhecido é pior. Como presentear alguém que você nem sabe quem é? Não tem como agradar. É presente genérico mesmo. Gravata ou lenço para homens, perfume do Boticário para mulheres. E não esquece de deixar o vale-troca dentro da embalagem, pois ele será usado com certeza absoluta. Cara de bunda-de-fora-no-meio-da-missa na hora da entrega também vale neste caso.

Agora, nada pior que tirar o chefe. Mesmo se ele for seu camarada e vocês já tenham tomado um chope em outras ocasiões. Não tem jeito, tem que dar presente bom. Tem que estourar o limite imposto. É uma bajulação medonha, mas quase obrigatória. E não é mal vista pelos colegas. Não, não. É quase vista como uma manobra de sobrevivência. O único que não perdoa é o limite do cartão. Esse, meu amigo, sofre. Esquece as nozes e o tender na ceia com a família. Não vai caber no orçamento.

Este ano participo de dois Amigos Secretos. O primeiro, do antigo pessoal da faculdade, já rolou e foi um tanto triste. De uma presença mínima de 20 pessoas no começo da "tradição", caímos para 8 participantes (alguns até mesmo relutantes!) em míseros 7 anos de formados. Temo ser a última vez que fazemos algo assim. Ganhei um presente bom: "Memórias de minhas putas tristes", do Gabriel Garcia Marquez, um livro que faz tempo quero ler mas por alguma razão ainda não li. Meu amigo secreto ganhou um exemplar do "Visões de São Paulo" autografado. Tá, foi um presente meio mesquinho, egocêntrico até, mas foi de coração. O saldo está baixo e a oportunidade era óbvia demais para não ser utilizada.

Semana que vem é a vez do Amigo Secreto aqui da empresa. Não coloquei nenhum presente na lista ainda, não por despeito, não, mas é que para me presentear é complicado. Sempre que me perguntam: "O que você quer ganhar" eu fico com um imenso vácuo cerebral. Não lembro de nada. Ou ao menos nada que caiba no limite estipulado (quem quiser me dar o box da Trilogia X-Men (R$69,00) ou o DVD "Score" do Dream Theater (R$ 81,00) fica a vontade!). Pensei em pedir um vale-livro, pra poder escolher depois com calma, mas se tem uma coisa que no momento eu não estou precisando é aumentar minha pilha de futuras leituras. Tá grande. O Gabriel Garcia até furou para a segunda posição (empurrando o Kurt Vonnegut e seu "Café da Manhã dos Campeões" para terceiro lugar), mas não dá pra viver só de livros. Tenho outras necessidades.

Acho que vou pedir um joypad para PC, pois o meu quebrou e estou no meio de um campeonato online de Winning Eleven 8 com o pessoal aqui do trabalho (e olha que eu nem gosto de futebol!), mas temo estragar minha estratégia, vitoriosa até agora, de surpreender a todos jogando pelo teclado. Mas há outros jogos. E o preço cabe no limite. É o finalista até o momento.

Mas venhamos e convenhamos, é uma tradição bem besta essa, não é?

Era uma vez um Kiwi

Animação que pode ser lida como cruel ou inspiradora.

13 dezembro 2006

Decepção


Aconteceu ontem, mas deixei a raiva esmorecer um pouco antes de escrever algo a respeito.

(Aliás, até escrevi. Escarrei um pseudo-poema numa comunidade do Orkut)

Não, não é nenhuma tragédia. Ninguém morreu, adoeceu ou desapareceu de minha vida. Não, nada disso. Foi apenas uma derrota pessoal. Narcisista é claro, mas ainda assim uma derrota. É fui recusado por mais uma editora. Sei, sei, não é nenhuma novidade, nada demais, mas neste caso eu tinha certa esperança (que até culminou neste pôste). Ontem mandaram um emeio lacônico, elogiando a obra mas mesmo assim recusando-a. Ou seja, deja vu de escritor.

Ontem, após a leitura da recusa, várias coisas passaram por minha cabeça. Várias. Primeiro a óbvia raiva da editora. Depois raiva de minha incompetência. Depois um misto dos dois. Pensei em largar a literatura (traduzindo: pití de artista). Pensei em transformar o livro em e-book e distribuir gratuitamente. Eu seria um rebelde! Um ícone da contracultura! Nada de "Roubem este Livro". "BAIXEM este Livro!!".

E rebaixem seu autor.

Daí fui dormir e hoje acordei sem tanta frustração. Quanta gente passou por isso? Quanta gente desistiu e optou por soluções paliativas? E eu seria mais um? Mais um rato prestes a ser capturado por uma ratoeira travestida de editora sob-demanda? Não, NÃO!

A primeira coisa que fiz foi rever a lista de editoras que considerava minhas finalistas. Selecionei mais duas que tem algum potencial, anotei seus endereços, imprimi mais duas cópias do meu texto e vou voltar à carga. Enquanto não recebo a resposta termino mais um original (falta pouco) e martelo mais uma idéia que está assombrando meus neurônios há algum tempo. Três originais completos. Um embrionário. Nenhum publicado.

E daí, porra?

Preciso parar de me desapontar tanto com estas recusas. Preciso parar de me preocupar tanto com a publicação e mais em escrever. Publicar é como sexo: é conseqüência, não objetivo. E daí que mais uma editora recusou um original meu? E daí? Tento mais algumas vezes (ainda tenho cartuchos), e se não der certo jogo o original na gaveta e trabalho o próximo. Não posso deixar estes percalços se tornarem maiores que deveriam, ou então não escreverei mais. Não quiseram me publicar? Foda-se! Azar deles!

Tenho muito trabalho a fazer para perder tempo me preocupando com essas coisas.

05 dezembro 2006

O Velho e a Música

Nos últimos anos eu entrei num marasmo musical. Um autêntico onanismo de estilos e bandas. Explico. Sempre fui adorador de música. Em meus tempos de moleque adorava propalar aos quatro ventos o alcance de meu conhecimento dos mais variados estilos. Meus amigos costumavam me testar em bares onde tinham jukeboxes. Eu precisava adivinhar a música logo nos primeiros acordes, ou então tinha que pagar a cerveja. Se acertasse, a minha próxima era de graça. Um tipo de "Qual é a Música" mais boêmio. E eu raramente errava, mesmo depois de tomar várias de graça. Ainda hoje minha esposa e minha filha se surpreendem quando vamos a locais com música ambiente e eu reconheço algumas músicas obscuras que DJs frustrados colocam nas seleções, escondidos entre os inevitáveis Smooth Operator, do Sade (que é o nome da banda, e não da vocalista, como imaginam) e Sowing the Seeds of Love, do Tears for Fears (ou, como gosto de dizer, para deleite de minha filha, "Tias Fofinhas", uma piada jurássica mas renitente).

Acontece que de uns anos para cá eu amarrei um bode preto tão grande para a música que simplesmente não consigo mais ouvir coisas novas. Descobri isso quando comprei um tocador de MP3 para o carro. Comprei um daqueles tubos cheios de mídias virgens, sentei na frente do computador e decidi fazer compilações e discografias das bandas que eu mais ouvia. Gravei apenas 4 CDs. Sério.

Atualmente minha playlist se resume à complexidade absurdamente técnica dos americanos do Dream Theater, ao heavy folk-medieval dos alemães do Blind Guardian (apesar dos últimos álbuns terem de decepcionado um bocado), e à grandiloqüência melodramática dos italianos do Rhapsody (agora renomeado Rhapsody of Fire, bleargh!).

"Ah, você é metaleiro!", você deve pensar, desapontado(a). Já fui, confesso. Metaleiro de butique, cabeludo com camiseta preta de banda, calça jeans rasgada e coturno surrado. Mas hoje, aos 32 anos, fica um pouco ridículo manter esse visual. Só se salvou o cabelo comprido, mas mais por razões estéticas particulares do que efetivamente uma revolta contra o "sistema". Aliás, me ocorre agora que o fato de eu ter virado analista de sistemas não deixa de ser uma ironia divertida. Mas, claro, divago.

O caso é que mesmo sendo um "metaleiro" fanático pelos "dinossauros" como Sabbath, Purple, Hendrix, Maiden, Floyd ou Zeppelin (eu sei, faltou um na lista, mas nunca consegui engolir aqueles quatro "cabeças de tigela" de Liverpool, apesar de respeitar sua influência) eu nunca menosprezei outros estilos musicais. Quero dizer, eu menosprezava músicas ruins, independente do estilo, mas sabia reconhecer qualidades em, por exemplo, composições de pagode e até mesmo (mais raramente) sertanejas. Lembro-me de me emocionar ao assistir uma apresentação de chorinho em meu colégio! Funk carioca, claro, é uma exceção, pois não considero aquilo música. Aliás, nem funk é. Funk para mim é James Brown e George Benson. Aquilo é... Sei lá o que é aquilo! Só não é música! Olha eu me desviando do assunto de novo...

Hoje me pego discutindo com minha filha a respeito disso. Reclamo quando a vejo assistindo clipes da Cristina Aguilera, Pink, Gwen Stefani, Beyoncé e outras porcarias pasteurizadas do gênero. E repito a frase que tanto ouvi em meus tempos de moleque: "Isso aí é tudo a mesma coisa!". E a mesma regra se aplica às bandas brasileiras. Não consigo ouvir dois acordes de CPM22, Jota Quest ou Charlie Brown Jr. sem mudar logo de estação. MPB então, está "uó". Ana Carolina é uma chata. De galochas (imagem divertida!). E ninguém tira da minha cabeça que a Maria Rita não é apenas um cover mal acabado da mãe. Bossa para americano premiar com suas esmolas gramofônicas e colocar em sistemas de som de elevadores.

Posso estar envelhecendo, e também posso estar repetindo um discurso tão quadrado e careta quanto estes adjetivos, mas faz tempo que eu não descubro uma música ou uma banda que me ligue, que me desperte e me faça curtir cada compasso com (me perdoem os mais jovens) Tesão. Com T maiúsculo mesmo. Parece que todos os estilos estão se mesclando e se tornando algo simplesmente sem alma, sem groove. E sinto falta disso.

Música boa me leva às lágrimas. Literalmente. E ultimamente eu tenho chorado apenas com reminiscências do século XX. E são lágrimas de dèja vu. Então ou estou adquirindo um gosto apurado e refinado (a.k.a. "ficando velho"), ou estou ficando chato (a.k.a. "velho ranzinza"). Em qualquer um dos casos, fica um sentimento de orfandade musical. Sou do tempo que se acendiam isqueiros e não celulares nos shows. Dos guitar heroes. Da música como exercício de expressão tanto quanto veículo para diversão. Hoje não. Hoje só temos enlatados. Bits musicais efêmeros e descartáveis, baixados e apagados com a mesma velocidade. Não vemos mais os clássicos-de-berço. A industria fonográfica se transformou em um imenso berçário de natimortos.

Não sei porque, mas me deu vontade de ouvir Ideologia, do Cazuza. Música boa é isso aí. É referência, e não parte do cenário. Tem o que dizer e não tem prazo de validade.

(Este texto foi escrito ao som de Master of Puppets, do Metalica, mas na versão bootleg do Dream Theater)

04 dezembro 2006

Mil Palavras

O dito cujo. Acabamento de primeira, recheio idem.


Eu e a também autora Roberta Nunes. Haja sorrisos!


Maurício Mikola e eu. Frente e verso. Mas sem poesia.


Eu e Luciana Muniz.


Bombou. Sério.


A galera se espremeu atrás de um livro grátis.


Quem disse que escritor não tem mãe? Tem, e às vezes também tem pai. Taí a prova que não fui gerado espontaneamente em uma fusão a frio na Noruega (toda fusão na Noruega é a frio?).


Aglomeração. E eu no meio da multidão. Dando uma de bicão.


Minha fotógrafa oficial, Carmen Orlandi.


Minha filha, Liz.


GRANDE Gustavo!

"Please, don't shoot!"