Não, não vou aqui dar uma fórmula mágica que o irá livrar definitivamente de ficar cantarolando o dia inteiro a música do porquinho do Hi-5 (não clique!), mas eu criei uma estratégia que, se usada corretamente, torna a experiência de assistir esses programas um pouco mais tolerável. Quem assiste esses programas sabe que, por serem direcionados para crianças pequenas (e sem um senso crítico muito apurado), a maioria das tramas é estapafúrdia e cheia de clichês, com intenção pedagógica e moral óbvia, o que torna a experiência quase excruciante para o espectador um pouco mais maduro. Mas não entre em desespero. Há uma saída.
Qual? Simples: criar subtextos para os personagens.
As histórias já são cheias de brechas para um espectador criativo. Tudo o que você precisa é prestar atenção e preencher as lacunas. Use sua imaginação e tente elaborar uma história de fundo que possa ter criado aquele universo, aqueles personagens. Crie situações que justifiquem suas personalidades e até mesmo suas aparências. E depois passe a assistir os programas com essa história não contada na cabeça.
Achou complicado? Seguem então alguns exemplos que utilizo:
Backyardigans
Os Backyardigans são cinco criaturas, antropomorfizadas em crianças, brincando em um quintal comum entre suas casas ("back yard" é quintal dos fundos, daí o nome). Lá eles se juntam em aventuras cheias de imaginação, explorando mundos e situações em aventuras imaginárias. Quem já assistiu sabe que ele até pode ser divertido, mas chega uma hora que não dá mais pra aguentar as musiquinhas. É tudo muito fofinho, muito certinho, muito pasteurizado.
E o que fazer?
Bom, eu passei a imaginar esse "mundo" criado pelos Backyardigans como uma versão do Limbo das religiões cristãs. Aquele lugar para onde vão as crianças que morreram antes de ser batizadas (já que mandar eles para o Inferno seria muita crueldade). Lá eles seriam crianças por toda a eternidade, num eterno quintal, onde com suas imaginações combinadas podem superar o tédio criando aventuras em mundos diversos, sem limitações físicas, como um Holodeck Divino, tudo sob a supervisão estrita do Todo Poderoso em pessoa.
Quem é o todo poderoso? A Uniqua, é claro. Veja: Pablo é um pinguim. Tyrone é um alce. Tasha é um hipopótamo. Austin é (eu acho) um canguru. E que diabos é a Uniqua?
De todos os personagens ela é a única (RÁ!) que não tem uma contraparte animal. E, pelo nome, remete a algo único, uno. Pronto: a Uniqua é um avatar de Deus, supervisionando o pós-vida das pobres crianças amaldiçoadas pela ausência do batismo.
Obs.: Essa teoria também ajuda a explicar por que Pablo canta o verso "Odiamos o lugar" na música de abertura.
Icônicos
Cara, esse é osso! Conta a história de Nat, um rapaz meio bobo que "inventou" uma máquina que consegue ver o "mundo dos icônicos", animais falantes minimalistas que vivem aventuras tolas. Além disso, o aparelho ainda dá a oportunidade dele trazer uma criatura de sua escolha para o "mundo real", onde resolverão juntos algum problema trivial.
E se Nat na verdade fosse um esquizofrênico visual, internado em uma cela acolchoada em um sanatório qualquer, e os "Icônicos" não passassem de suas alucinações? Perceba: Nat nunca sai da mesma sala (está preso!), não conversa com ninguém além dos icônicos que "sequestra" de seus mundos, tem problemas imaginários, que seus amigos imaginários ajudam a resolver. Assista o programa com essa ideia na cabeça e você verá que tudo faz mais sentido.
O Gatola da Cartola
Baseado no livro "The Cat in the Hat", do Dr. Seuss, o Gatola é um gato de chapéu que leva um casal de crianças em aventuras pelo mundo. Quem leu o livro sabe que o desenho é bem menos anárquico, mas mesmo assim dá pra melhorar: O Gatola na verdade é o Diabo, tentando as crianças (Nick e Sally mas imagine-os como Adão e Eva) a sair de seu mundo "seguro" (a casa dos pais, ou o Jardim do Éden) e conhecer o mundo, sempre colocando-os em diversas confusões.
Hora do Justin
Justin é um garoto que tem um amigo imaginário (Fofuxo) e uma imaginação fértil, que o leva a diversas aventuras em histórias que o fazem compreender seus problemas infantis. Ele conta com a ajuda de uma garota (Olívia), que sempre aparece quando ele entra em seu mundo imaginário.
Agora imagine o seguinte: Fofuxo na verdade era o peixe dourado de Justin, que morreu e sua mãe disse que ele tinha ido "para um lugar melhor". A mesma coisa que dizem quando falam a respeito de Olívia, primeira filha do casal que faleceu antes de Justin nascer. A mente fértil de Justin então cria seu amigo imaginário e somatiza sua irmã, de modo a fazer companhia para ele em suas aventuras fantasiosas. Tente assistir o programa de novo pensando nisso.
O Pequeno Príncipe
Esse não tem jeito. É chato demais. Desligue a TV e vá brincar de outra coisa com seu filho.
Estes são apenas alguns exemplos. Há diversos programas, e a maioria deles dão abertura para uma mente fértil e doentia como a sua para transformá-los em algo divertido. Não tenha medo de usar temas tabu ou adultos demais. Aliás, quanto mais pesado for o subtexto, mais interessante é o exercício.
Só não divida essas ideias com seus filhos! Não ainda. Deixe-os curtir sua inocência em paz. Depois, quando eles migrarem para o Cartoon Network ou Nickelodeon, pode contar. Se bobear você voltarão de vez em quando ao Discovery Kids só para brincar de "adivinhe o subtexto".
Um comentário:
Eu sei de alguns restaurantes em itaim bibi temáticos, há um que estai decorado com fotos do personagens infantis, meu filho gosta de ir lá.
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