24 março 2010

Não Nana Nenê


Papai tchau-tchau. Mamãe não aqui. Nenê gosta mamãe. Mamãe beija nenê. Quente-quente aqui. Nenê tosse-tosse. Nenê quer suco-suco. Tetê. Mamãe dá tetê Nenê. Nenê gosta tetê. Nenê quer colo. Nenê aqui e papai tchau-tchau. Quer Mamãe Nenê. Mamãe dá Dedé abraço Nenê. Sai Dedé. Quente-quente. Nenê quer tetê. Nenê chora. Nenê aqui carro corre-corre. Carro corre não-não. Quente-quente. Nenê quer casa. Quer vesseiro. Chora mais Nenê. Pepeta cai boca Nenê. Nenê chora mais. Nenê quer pepeta. Pega pepeta Nenê, Dedé. Dedé pega pepeta não. Dedé bobo. Nenê quer água. Nenê caca nariz. Mamãe limpa Nenê. Nenê gosta mamãe. Mamãe não aqui. Nenê chora. Nenê cansa. Tosse-tosse. Moça fora carro corre-corre. Moça vê Nenê. Moça fala. Nenê chora. Moça bate-bate janela. Moço bate-bate porta. Nenê cansado. Quer naninha. Quer vesseiro. Quer Dedé. Nenê quente-quente. Nenê tetê não. Moço grita. Moça grita. Grita não moça. Nenê soninho. Grita não moço. Nenê quer naninha. Tum, tum janela. Nenê chora. Nenê não chora. Nenê soninho quente-quente. Dedé pepeta tetê soninho. Quente-quente. Nenê quer mamãe. Moça não mamãe. Moço não papai. Soninho... Tum, tum. Acorda Nenê. Nenê chora. Nenê não chora. Janela bum. Nenê pula. Moça pega Nenê. Nenê soninho. Moça upa-upa Nenê. Nenê não chora. Nenê soninho. Moça upa-upa. Papai grita Nenê. Mamãe não grita Nenê. Nenê quer chorar. Nenê soninho. Papai upa-upa Nenê. Soninho... Moço fuu boca Nenê. Tosse-tosse. Fuuu. Nenê quer mamãe. Nenê quer tetê. Nenê quer Dedé. Nenê pepeta Dedé tetê. Papai chora. Soninho. Fuuuu. Mamãe nenê colinho vesseiro Dedé tetê papai. Soninho Nenê. Nenê dorme.

Nenê não chora.

22 março 2010

Pelo fim do amadorismo literário


Hoje acordei e me deparei com um imenso bafafá no Twitter, no Orkut e no meio do fandom em geral. Não vou entrar em detalhes, mas certo autor recebeu uma crítica extremamente negativa a seu romance recém lançado, retrucou o crítico, angariou apoio na base de fãs, conseguiu detratores por conta de sua postura frente à crítica e etc. Mudam as moscas mas a merda é a mesma de sempre. Se você participa do meio, sabe de quem estou falando e não há a necessidade de apontar nomes, culpados ou vítimas (até mesmo porque não gostaria de me envolver diretamente nesta briga). Se você não faz ideia do que estou falando, o exemplo também cabe.

Ponderando a respeito deste assunto, acabei tropeçando num excelente artigo postado por Larry Brooks em seu StoryFix (se você não conhece este site e sabe ler em inglês, recomendo muito a visita). Nele Brooks faz uma analogia esportiva a respeito de um problema sério, que cada vez mais vejo abater sobre essa nova geração de autores que tentam, de todas as maneiras, fazer sucesso no meio literário.

Chama-se MATURIDADE.

Não maturidade no sentido biológico, mas a maturidade profissional. Como sempre digo, escrever é muito mais do que alinhar palavras. Todo autor, assim que termina seu original, é fã incondicional de seu trabalho. Acha que aquele pedaço de texto irá revolucionar a literatura brasileira, quiçá a mundial. Será reverenciado, traduzido, virará filme, deixará o autor milionário. E é este o maior problema.

Autores devem ter em mente uma coisa: por mais que você se esforce para escrever bem, sempre existirão detratores à sua obra. Sempre haverá espaço para críticas negativas. Críticas são parte do ofício. Você cria, alguém critica. É inevitável. Quem não quer crítica não deve colocar seu texto para escrutínio público. O que diferencia um escritor de uma pessoa que escreve é a maneira que recebe essas críticas. O cara que escreve fica ofendido, defende sua obra com unhas, dentes e impropérios. Já o escritor de verdade tira vantagem até mesmo das mais negativas críticas e nunca (enfatizo: NUNCA) retruca como se tal crítica fosse um ataque pessoal. Mesmo que seja, bem entendido.

Preste atenção: será que sua obra estava madura o suficiente para ser publicada? Tem certeza? Ela passou pelo crivo de leitores críticos sérios, foi revisada diversas vezes, teve todas as referências comprovadas? Há erros de lógica, de ritmo, de coerência? Há erros históricos grosseiros? Personagens rasos, inconsistentes, desnecessários? Pense bem. Seja honesto.

Escrever um livro não é fácil. Não basta apenas querer contar uma história. É preciso muito trabalho antes mesmo de sentar a bunda na cadeira e começar a digitar. Mas muito mesmo! Horas e horas a fio numa pesquisa interminável. Dias criando cenários, personagens, delineando a trama, escrevendo, reescrevendo, apagando, aumentando, corrigindo. É uma imensa labuta, que quase nunca termina sem defeitos. E é função dos críticos apontarem esses problemas. E papel dos autores ouví-los.

Diversas obras são lançadas diretamente para o oblívio literário, e o único culpado por isso é o autor. Seja humilde, perceba que você não é o centro do universo e que seu livro pode sim ter defeitos graves (e quase certamente os terá). Aceite as críticas que recebe e volte ao texto com outros olhos. OUÇA, pelo machado de Assis! Aceite que você não é perfeito. É o mínimo que se espera de um escritor que deseja ser tratado como tal.

Chega de amadorismo, gente. Os leitores agradecem.

E os críticos também.

17 março 2010

Nota de Falecimento


Morreu esta madrugada, em pleno exercício de inflamada hipérbole, aquele gigantesco perdulário. Aquele que desperdiçava nossas sagradas horas com seus intermináveis e desnecessários adjetivos. Que frequentemente maculava nossa fluidez com notadamente inócuos advérbios. Foi encontrado em decúbito dorsal, como convinha para a foto, o cadáver em rigor mortis repleto de irrelevantes termos técnicos. Morreu como queria, afogado no próprio vômito e debruçado numa rima sem teto. Deixa três gavetas e um romance, que sem sua obstinada persistência sequer existiriam senão numa metáfora óbvia. A polícia ainda não tem pistas de quem possa ter perpetrado essa grata contravenção, mas todos sabemos o porque. Por uma morte noir e estilosa, como em um conto policial formulaico. Uma morte sobrenatural, inexplicável. Um mistério a ser desvendado. Ao invés de o nome do carrasco, escreveu um enigma de próprio pulso. Um estereotipado detetive cuidará do caso. “Nós não podemos nos esquecer de tudo que ele nos trouxe. Devemos-lhe o devido respeito”, disse o detetive, cheio de pronomes e intervenções. Foi uma morte arquetípica, privada de sinônimos. Morreu e não deixará saudades.

Eu sou Ferdinando Galvão, o assassino do Chavão.

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N. do A.: Este texto foi o resultado de um exercício proposto na aula de Marcelino Freire durante a minha Pós Graduação de Criação Literária. O exercício me deu três elementos: o nome do personagem (Ferdinando Galvão), sua profissão (locutor) e o início do texto ("Morreu nesta madrugada..."). O resultado foi esse aí. Desculpem se o título assustou alguém.